Nelson Rodrigues assiste terra em transe:
Uma análise do silêncio do povo à luz de duas éticas-estéticas contrastantes
Palavras-chave:
Estética, Ética, Silêncio., Memórias, Síntese disjuntivaResumo
Partimos da premissa de que a tentativa de equacionar a tensa e múltipla relação de sentido estabelecida por Nelson Rodrigues ao deparar-se com a peça cinematográfica de Glauber Rocha, passa a produzir resultados interpretativos-conceituais mais enriquecedores a partir do momento em que a encaramos sob a perspectiva do conceito de síntese disjuntiva. Iniciamos com um cotejamento analítico-descritivo das posturas ético-estéticas dos dois autores referentes ao tema do silêncio do povo, que possibilita vislumbrar o verdadeiro acontecimento deste encontro. Um modelo de estudo comparativo é delineado se valendo do conceito de obra aberta, com o intuito de avançar uma leitura na qual as incompatibilidades e distâncias não sejam vistas de forma provisória e não-essencial. Argumentamos, a partir de Deleuze, que a tradição literária-filosófica, formada na lógica aristotélico-kantiana e regulada pelo princípio da não contradição, ou informada por uma ânsia de produzir sínteses, subaproveita o encontro de Nelson Rodrigues com Glauber Rocha. Concluímos defendendo que o que liga os dois artistas seria o reconhecimento de suas diferenças irreconciliáveis, aliado à intuição de Nelson Rodrigues de que os efeitos da obra não dependeriam de sua aproximação com as concepções do cineasta baiano. As unicidades do criador e espectador não são assim diluídas, mas antes potencializadas no reconhecimento de que esta disjunção é fundante de um encontro que precede as individualidades e ultrapassa as sínteses comparativas.
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