O romance testemunhal como romance de formação

figurações da violência e da crueldade na obra Memórias de um sobrevivente, de Luiz Alberto Mendes

Autores

DOI:

https://doi.org/10.52521/21.8350

Palavras-chave:

Romance Testemunhal, Romance de Formação, Romance Brasileiro Contemporâneo, Luiz Alberto Mendes

Resumo

Por que narrar o sofrimento sob a forma de memórias, (auto)biografias ou a partir de outros registros, como o romance? Para além do trabalho de elaboração do sofrimento e da violência, pode-se notar que o testemunho pode fazer parte da construção de sentido a eventos passados, o que não significa a reconstituição virtualmente fidedigna dos eventos, dos participantes (vítimas, perpetradores e testemunhas), dos cenários etc., mas as diferentes formas a partir das quais a violência e o sofrimento são tratados, figurados e significados.A partir desses pressupostos, analisamos o livro Memórias de um sobrevivente, de Luiz Alberto Mendes, no qual é apresentada a “carreira penal” do autor como criminoso. Pretendemos demonstrar que o romance testemunhal, em casos específicos como este, apresenta-se também como espécie de romance de formação: não a formação do indivíduo burguês típico, modelar, consagrado em Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister, de Goethe, mas a formação do indivíduo subalternizado, produto de uma sociedade capitalista periférica marcada por profundas desigualdades, exclusões e toda sorte de violências.

Biografia do Autor

Enio Passiani, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Doutor pela Universidade de São Paulo (2007); Professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e do Mestrado Profissional em Segurança Urbana, todos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); vencedor do Prêmio José Albertino Rodrigues de melhor dissertação de mestrado do concurso CNPq-ANPOCS de Trabalhos Científicos e Teses Universitárias em Ciências Sociais, em 2002; autor do livro "Na trilha do Jeca: Monteiro Lobato e a formação do campo literário no Brasil" (Bauru, SP: Edusc, 2003), e de artigos em jornais do Brasil e exterior sobre pensamento social brasileiro, sociologia da literatura e leitura, sociologia da cultura e teoria social - com ênfase em autores como Pierre Bourdieu, Norbert Elias, Raymond Williams e Émile Durkheim. É líder do GECCA-Sul (Grupo de Estudos em Cultura, Comunicação e Arte), grupo de pesquisa registrado no CNPq, que desenvolve atualmente uma pesquisa intitulada "Sonhos, sociedade e pandemia", que visa desenvolver uma sociologia de dois sonhos em contexto pandêmico. Recentemente também tenho me dedicado ao estudo da sociologia digital.

Gabriele dos Anjos, Observatório Estadual de Segurança Pública da Secretaria de Segurança Pública do RS

Historiadora e Doutora em Sociologia pela UFRGS. Trabalha como pesquisadora em Sociologia no Observatório Estadual de Segurança Pública da Secretaria de Segurança Pública/RS. Seus principais temas de investigação são políticas de segurança pública e violência contra as mulheres. 

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Publicado

2023-07-10

Como Citar

PASSIANI, E.; ANJOS, G. dos. O romance testemunhal como romance de formação: figurações da violência e da crueldade na obra Memórias de um sobrevivente, de Luiz Alberto Mendes. O Público e o Privado, Fortaleza, v. 21, n. 44, p. 101–112, 2023. DOI: 10.52521/21.8350. Disponível em: https://revistas.uece.br/index.php/opublicoeoprivado/article/view/8350. Acesso em: 11 maio. 2024.