Judicialização do acesso a medicamentos no Ceará e biopolítica

Autores

  • Samantha Araújo de Andrade Medeiros
  • Maria Lírida Calou de Araújo e Mendonça Doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE e Professora do Curso de Graduação em Direito da Universidade de Fortaleza (UNIFOR/CE https://orcid.org/0000-0001-5710-7499

DOI:

https://doi.org/10.47455/2675-0090.2020.2.5.4855

Palavras-chave:

poder judiciário e saúde, biopolítica, judicialização e medicamentos

Resumo

O objetivo deste trabalho é a problematização do acesso a medicamentos por via judicial, analisando-se a relação entre os poderes médicos e jurídicos na promoção do direito ao acesso a medicamentos no Estado do Ceará, à luz do conceito de biopolítica desenvolvido por Michel Foucault. Partiu-se da análise de processos judiciais impetrados contra as Secretarias de Saúde do estado do Ceará (SESA/CE) ou contra a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), no período de 2014 a 2017, cujos objetos estavam voltados à solicitação de medicamentos para o tratamento de doenças crônico-degenerativas. Utilizou-se a análise do discurso, numa perspectiva foucaultiana, para identificar as visões dos atores que compõem os processos judiciais, examinando-se as diferentes maneiras pelas quais o discurso desempenha um papel em sistemas estratégicos. Nos casos analisados, foi observado o condicionamento do Estado às evidências do mercado, da Medicina e do Judiciário. Agenciado ao discurso médico, vislumbrou-se o discurso do magistrado em torno da vida humana, na busca de normatizá-la. Este trabalho acena para a necessidade de realização de investigações mais aprofundadas que permitam a construção de medidas capazes de tornar a sociedade sujeito político no contexto biopolítico. A existência de uma demanda por medicamentos junto ao Poder Judiciário demonstra a ingerência deste nas tomadas de decisões da política pública de saúde no Ceará.

Referências

BEVERIDGE, W. Social insurance and allied services. London: His Majesty’s Stationery Office, 1942.

BIEHL, J. The postneoliberal fabulation of power: on statecraft, precarious infrastructures, and public mobilization in Brazil. American Ethnologist, Washington, D.C., v. 43, n. 3, p. 437-50, 2016.

________. Patient-citizen-consumers: judicialization of health and metamorphosis of biopolitics. Lua Nova, São Paulo, v. 98, p.77-105, 2016.

BRASIL. Ministério da Saúde. Informe Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde. Saúde é tema de audiência pública no Supremo Tribunal Federal. Edição Especial, v.6, n.1, jun.2009. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/periodicos/informe_CTI_Judicializacao.pdf>. Acesso em: 28 dez. 2017.

BRINKS, D.M.; GAURI, V.; SHEN, K. Social rights constitutionalism: negotiating the tension between the universal and the particular. Annual Review of Law and Social Science. Palo Alto, v. 11, p.289–308, 2015.

CARVALHO, M. N.; LEITE, S. N. Itinerário dos usuários de medicamentos via judicial no estado do Amazonas, Brasil. Interface – Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, v. 18, n. 51, p. 737-748, 2014.

CHIEFFI, A. L. Análise das demandas judiciais de medicamentos junto à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo à luz da Política de Assistência Farmacêutica. Tese (Doutorado em Ciências) – Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, 2017.

CHIEFFI, A. L.; BARATA, R.C.B.; GOLBAUM, M. Legal access to medications: a threat to Brazil’s public health system? BMC Health Services Research, London, v. 17, n.34, p.499, 2017.

COLUCCI, C. Judicialização faz desigualdade na saúde avançar. Folha de São Paulo, São Paulo, 29 mar. 2014, Seminários folha.

FERRAZ, O. L. M.; VIEIRA, F. S. Direito à saúde, recursos escassos e equidade: os riscos da interpretação judicial dominante. DADOS – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 52, n. 1, p.223-251, 2009.

FOUCAULT, M. Vigiar e punir – Nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 2004.

_______. Ditos e escritos IV. Estratégia, poder-saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.

________. Em defesa da sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

________. Microfísica do poder. 13ª edição. - Rio de Janeiro: Edições Graal, 1998.

________. O nascimento da biopolítica. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

________. Segurança, território, população. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

________. A vontade de saber – História da Sexualidade I. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2005.

________. Crise da medicina ou da antimedicina. Verve, n. 18, p. 167-194, 2010.

________. O nascimento da clínica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.

________. A verdade e as formas jurídicas. 2ª edição. Rio de Janeiro: NAU Editora, 2002.

GOSTIN, L. O.; ARCHER, R. The Duty of States to Assist Other States in Need: Ethics, Human Rights, and International Law. Journal of Law, Medicine & Ethics, Medford, v. 35, p. 526-533, 2007.

HIRSCHL, R. Towards Juristocracy: The Origins and Consequences of the New Constitutionalism. Cambridge, MA: Harvard Univ. Press, 2009.

________. The judicialization of politics. In: GOODIN, R. The Oxford Handbook of Political Science. Oxford: Oxford Univ. Press, 2011.

LUIZA, V. L. Acesso a medicamentos essenciais no Estado do Rio de Janeiro. 2003. 247 f. Tese (Doutorado em Saúde Pública) – Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2003.

MACHADO, R. Nietzsche e a Verdade. 2. Ed. – São Paulo: Paz e Terra, 2002.

MARQUES, S. D.; DALLARI, S. G. Garantia do direito social à assistência farmacêutica no Estado de São Paulo. Revista Saúde Pública, São Paulo, v. 41, n. 1, p. 101-107, 2007.

MELLO, A. Efeitos colaterais. Correio Braziliense, Brasília, 26 dez. 2016, Sociedade, p. 5.

PATEMAN, M. G. Towards the new Jerusalem: Manchester politics during the Second World War. 2000. 291 f. Tese (Doutorado em Filosofia) – University of Huddersfield, Huddersfield, 2000.

PEREIRA, P. Política Social: Temas e questões. São Paulo: Cortez, 2008.

PIERRO, B. Demandas crescentes. Revista Pesquisa FAPESP, São Paulo, Ed. 252, p. 18-25, fev. 2017. Disponível em: <http://revistapesquisa.fapesp.br/wp-content/uploads/2017/02/018-025_Judicializacao_252_NOVO.pdf>. Acesso em: 28 dez. 2017.

RESNIK, D. B. Responsibility for health: personal, social, and environmental. Journal of Medical Ethics, London, v. 33, n. 8, p. 444-445, 2007.

ROZENFELD, S., org. Fundamentos da Vigilância Sanitária [online]. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2000. Disponível em: <http://books.scielo.org/id/d63fk/pdf/rozenfeld-9788575413258.pdf>. Acesso em: 19 Jan 2018.

SANTOS, L.A.S. O corpo, o comer e a comida: um estudo sobre as práticas corporais e alimentares no mundo contemporâneo [online]. Salvador: EDUFBA, 2008, 330 p. Disponível em: < http://books.scielo.org/id/38m/pdf/santos-9788523211707.pdf>. Acesso em: 19 Jan 2018.

TATE, C.; VALLINDER T. The Global Expansion of Judicial Power. New York: NYU Press, 1995.

VALLINDER, T. The judicialization of politics. A worldwide phenomenon: introduction. Int. Political Sci. Rev. v.15, n. 2, p.91–99, 1994.

Downloads

Publicado

2020-07-01

Como Citar

Medeiros, S. A. de A., & Mendonça, M. L. C. de A. e. (2020). Judicialização do acesso a medicamentos no Ceará e biopolítica. Inovação & Tecnologia Social, 2(5), 66–80. https://doi.org/10.47455/2675-0090.2020.2.5.4855

Edição

Seção

Artigos